terça-feira, 3 de maio de 2011

Getsêmani




Sinto-me só, em meio a tantos.
Quero te ouvir, em meio ao pranto,
De quem te ama, amor humano.
Com incertezas, temores, espanto.

Nesta hora de pavor e tristeza,
O vazio de Ti já me devora.
Prensas-me no jardim, tão taciturno.
Sobram-me os  gemidos, como quem ora.

Não há anjos a me consolar,
No absurdo, genuflexo, te adorando,
Seguirei a via, minha crucis.
Meu suor é só suor, mas também sangro.

Venham amigos de jornada,
Para grande festa às avessas,
Celebremos com fel servido em cálices,
Tua vontade, a recompensa.

domingo, 1 de maio de 2011

Sem Estrela





A morte ia comigo e eu, com ela.
E vi o seu ridículo vestido,
o andar desajeitado e sem sentido,
o rosto com penteado de donzela,

sendo tão velha, velha, no ruído
de suas meias e sapatos de heras.
Então não resisti e me ri dela,
caçoava de seus gestos confundidos.

E desta sisudez que nada espera,
mas sabe que na vida um só gemido
pode fazê-la emudecer. Insisto

em rir de sua passagem sem estrela,
sem grandeza nenhuma. E se resisto,
é porque está em mim quem vai vencê-la. 


Carlos Nejar

sábado, 23 de abril de 2011

Respostas



Para o medo,
Coragem.
Se for ódio,
Amor.
Ansiedade,
Confiança.
Para o tempo ido,
Recomeço.
Desilusão,
Novos sonhos.
Ceticismo,
Deus.
Para a dor da perda,
Consolo.
Em meio a tragédia,
Solidariedade.
Quando for culpa,
Perdão.
Para os indiferentes,
Empatia.
Hipocrisia,
Com verdade.
Na velhice,
Carinho.
Solidão,
Um abraço.
Para quem se perdeu,
O Caminho.
A humanidade alienada de Deus,
Graça.
Quando enfim, a morte,
Última questão desta vida,
...
Primeiro dia,
...
Segundo dia,
...
Terceiro dia,
...
O túmulo está vazio:
- Ele ressuscitou!

segunda-feira, 18 de abril de 2011

O pastor e a ovelha





Não são as cercas que te prendem,
Nem o pasto que te basta,
Nem a quietude dos riachos,
Ou a segurança do rebanho.
Não é o medo, nem a solidão.
É o que tu és, tua essência.
Seja inverno, verão, ou estiagem,
Nos vales, campos, montes, ou bosques.
Eu te conheço.
Tu me conheces.
Se errares o caminho,
Quando as trevas densas te cercarem,
Confia no que é, ovelha.
Confia no que sou, pastor.
Há abismos que te rodeiam,
E os perigos que te cercam,
Não poderiam te impedir
De ouvires a minha voz,
A chamar pelo teu nome.
E mesmo ferida, eu te ouço,
Não temas!
Minha vara e cajado te consolam,
Teu a aprisco te espera.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Até logo, tia Tusinha !




Hoje recebi a notícia do falecimento da minha tia Ivanilda (seu nome de batismo), mas acho que ela pensava em si mesma com o nome pelo qual toda a família a chamava: Tusinha! Não sei dizer a origem deste apelido, mas sei que até onde a minha memória alcança só me lembro de conhecê-la como “tia Tusinha”.  Minha tia teve uma vida sofrida, mãe de cinco filhos (três destes envolvidos em um acidente gravíssimo com a explosão de uma garrafa álcool, o que lhes marcou bastante), divorciada, evangélica (irmã do “círculo de oração”, com direito a coque e tudo mais). Além de criar da melhor forma possível seus filhos, enfrentar algumas enfermidades terríveis (entre elas uma rara e incurável chamada síndrome de Crohn, que ataca todo o trato digestivo), ela foi uma pessoa sem nada que chamasse atenção para si. Dona de um sorriso discreto, fazia uma torta de limão como ninguém, além de uns bombons de morango que só de lembrar me faz salivar a boca. Eu adorava quando ia passar alguns dias na sua casa, onde passava o dia brincando com os meus primos.

Ela foi uma pessoa comum, com experiências comuns, que fez da criação dos seus filhos, e posteriormente das atividades na igreja sua motivação de viver. Estava sempre em oração pela salvação dos seus filhos e demais familiares.  O que eu posso falar dela? Que era uma pessoa amável e amada, que em meio a inúmeros motivos para desistir, ela sempre foi grata a Deus pelo dom da vida. Quais os motivos para que alguém seja amado? Não sei, só sabemos que amamos uns e outros não, e eu amei a minha tia Tusinha. Posso afirmar que ela era singular (assim como somos todos nós!), no seu jeito, na sua voz, enfim, na sua personalidade. Era uma pessoa comum, e assim como são as pessoas comuns, incomparavelmente única.

Ao lembrar de como foi a sua vida, penso que para sermos amados não precisamos ser “super” em nada, não precisamos ser os melhores em nada, não precisamos competir com ninguém, não precisamos criar auto-enganos, tudo o que precisamos é simplesmente ser. Eu tenho motivos para amar a minha meiga tia Tusinha, mas Deus não precisa de motivos para nos amar, pois ele conhece cada particularidade das suas criaturas, conhece a nossa estrutura, e ainda assim (ou talvez por isso) nos ama.

Quero elogiar a autenticidade de quem não tem a necessidade de aparentar mais do que realmente é, e que por isso, deixa-se moldar segundo o propósito daquele que nos criou como somos, isso é ser cristão, isso é ser puro, isso é ser simples.

Para mim, assim como para a minha família que agora carrega a dor pela ausência, fica o privilégio de ter convivido com alguém tão doce quanto a tia Tusinha. Não sei poetizar a dor. Dor é dor. Mas confesso que aqueles que carregam no coração a certeza  que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito”, sentem a dor de forma diferente, pois encaram a morte não como um ponto final de uma existência, mas sim como o despertar para a eternidade, onde as dores e as lágrimas desta vida ficam para trás, e então embarcamos nesta última viagem rumo ao nosso lar verdadeiro, onde somos amados incondicionalmente, e como filhos que retornam ao lar, seremos recebidos com o abraço do nosso Deus e Pai.

Por isso tia, adeus não cabe entre nós, apenas um “até logo”, e se puder quando chegar a minha hora, gostaria de te pedir que me esperasse com uma torta de limão daquelas.

A Graça da garça !

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Sim, eu creio no Devorador!





Eu não entendo o dízimo como uma ordenança cristã. A instituição do dízimo para o povo de Israel servia como uma espécie de “Imposto de Renda”(principalmente no período pós-exílico) para a manutenção do Templo, dos Levitas (tribo sacerdotal que era mantida pelas doações das outras tribos), dos órfãos e das viúvas. Foi instituído por Deus com finalidades específicas, em um tempo em que a religião e o Estado estavam intimamente ligados. O ensino bíblico no Novo Testamento tira a questão da contribuição do campo da obrigatoriedade e chama para o coração, para a espontaneidade, tira do ritual e chama para as intenções, exterioriza o que está nas entranhas, e atribui valor ao propósito do ofertante e não a porcentagem da oferta. A síntese do pensamento neotestamentário encontra-se nos capítulos 8 e 9 de II Coríntios. Todos os demais textos em que o dízimo é citado no Novo Testamento necessitam de uma hermenêutica forçosa, onde Igreja vira Templo, cristão vira israelita, pastor vira sacerdote, e sacrifícios, prosperidades, pragas, maldições, altares, voltam a cena, tudo com a finalidade de legitimar esta prática. E é exatamente neste contexto, que surge o tal Devorador, isso mesmo, o demônio que se alimenta da já combalida conta-corrente daqueles que não entregaram seu dízimo ao sacerdote no altar do templo. E cuidado, pois ele não vem só, tem seus primos, o Cortador, o Migrador, e o Ceifador, todos imunes até mesmo ao outrora poderoso Nome de Jesus, pois o único antídoto para esse “quarteto fantástico” do inferno, são seus 10% mensais. Você já se questionou porque os textos prediletos de tais defensores dos dízimos estão sempre no Antigo Testamento?

                Dadas as gigantescas diferenças entre a ideologia cristã e a israelita, quero deixar claro que nos dias da igreja nascente, não se falava em 10%, mas em tanto quanto fosse necessário para suprir as necessidades dos irmãos, o que significava muitas vezes vender tudo e colocar o dinheiro sob a administração dos apóstolos. E sendo Paulo, o apóstolo dos gentios (ou seja, todo não-judeu), que não conheciam o Antigo Testamento e nem as práticas judaicas, não seria razoável que ele doutrinasse a igreja sobre esse assunto? A despeito disto ele não escreve uma linha sequer sobre o tema para os cristãos, tratando única e exclusivamente de ofertas alçadas e voluntárias. Mas as estruturas que mantemos hoje são caras demais, não se sustentariam com ofertas voluntárias apenas (o que é uma verdade), por isso não sou contra quem utiliza o método do dízimo para ofertar e ajudar a manter a estrutura eclesiástica da qual faz parte, mas nem por isso, preciso de um “pacman financeiro” no meu calcanhar, daqueles do tipo “se correr o bicho pega, e se não der o bicho come”.

                Resolvi escrever este texto não para falar contra o dízimo, e sobre as coisas que não creio. Quero falar sobre o que eu acredito, e sim, eu creio no devorador!

                Até o início deste ano eu fazia parte de uma grande igreja pentecostal na Baixada Fluminense aqui no Rio de Janeiro, onde por alguns anos liderei todo o departamento de ensino. Tudo corria bem, até o dia em que me perguntaram sobre o famigerado “devorador” descrito em Malaquias 3.11 (junto com o verso 10 é o “texto áureo“ do dízimo). Bem, eu precisei tomar uma decisão rápida, visto que estava em uma aula diante de uma classe de 30 pessoas aproximadamente, então optei por falar a verdade, segundo a minha consciência cristã. Respondi que, o texto se referia a uma praga, e que o tal devorador, era um tipo de gafanhoto, e que por Israel neste período tratar-se de uma nação predominantemente agrícola, representava uma enorme ameaça, e o texto chamava a Nação a um compromisso com Deus, e o propósito por Ele estabelecido na reconstrução da cidade e restauração do culto. E que para contribuir não precisamos de ameaças espirituais, mas sim gratidão a Deus pela sua bondade e amor. Foi então que conheci o verdadeiro devorador, não o do misticismo cristão-pentecostal, mas um pior, capaz de saquear coisas realmente valiosas.

                Perdi o convívio com pessoas a quem eu aprendi a amar. Gente que chorou comigo, gente com que eu chorei, me alegrei, que fizeram parte da história da minha vida, mas que se viram obrigadas a decidir, pois se as coisas que eu estava ensinando eram verdadeiras, então o local que, junto com seus familiares e amigos, eles abraçaram como igreja, estava errado. Fiquei só. Isso sim doeu, mas eu também tive que fazer escolhas, e escolhi ser fiel ao que minha consciência discerniu como sendo o verdadeiro Evangelho. Por isso não os culpo, nem os julgo, apenas lamento profundamente.

                Não tenho a menor pretensão de ser o dono da verdade, até porque, as verdades que considero absolutas são invisíveis aos olhos, são discernidas pela fé, e fé é certeza que se guarda no coração, que serve de âncora para a alma quando todas as certezas ao nosso redor parecem ter submergido. Apesar desta subjetividade quanto a verdade, falo com muita objetividade contra a mentira dita em nome de Deus. Não fui chamado para ganhar dinheiro com o Evangelho de Cristo, não faço parte de “esquemas” para obter casa própria, carro do ano, e salários de R$ 10.000,00, financiados pela fé das pessoas que são manipuladas em nome de um pseudo-evangelho, não fui chamado para me “alimentar da carne das ovelhas”.

                Em nome deste deus das riquezas, ao qual a Bíblia chama de Mamom (Mt 6.24), o Devorador se alimenta do medo de tocar no “ungido do SENHOR”, o Devorador se alimenta dos relacionamentos superficiais e interesseiros, se alimenta da falta de caráter maquiavélica de alguns líderes, onde os fins justificam os meios, o Devorador se alimenta da falta de conhecimento de Deus (Os 4.6). O Devorador se fortalece todas as vezes que nos esquecemos que o véu do templo foi rasgado e que todos temos acesso a Deus, e ao invés disto criamos intermediários entre Deus e homens, criamos nossos próprios ídolos.

Sim, eu creio no Devorador!

Porque nada trouxemos para este mundo, e manifesto é que nada podemos levar dele.
Tendo, porém, sustento, e com que nos cobrirmos, estejamos com isso contentes.

Mas os que querem ser ricos caem em tentação, e em laço, e em muitas concupiscências loucas e nocivas, que submergem os homens na perdição e ruína.

Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores.” 
(I Tm 6.7-10)


                Sou um sonhador? Sim, e daqueles que não tem cura. Sonho com um Evangelho puro e simples, que dê glórias só a Deus, que leve os pecadores ao arrependimento, que nos leve de volta ao Pai. Sonho com estruturas que sejam um meio e não um fim em si mesmas. Sonho, mas sei que não estou sozinho, muitos tem ouvido o chamado do Pai para despertarmos e o seguirmos na construção do Seu Reino.


Para meus amados(as) aluno(as):
“Sonho com o dia em que os sapos voltarão para as lagoas, e nos seus lugares, os verdadeiros filhos de Deus se assentarão, para a glória do nome de Jesus.”