Eu não entendo
o dízimo como uma ordenança cristã. A instituição do dízimo para o povo de
Israel servia como uma espécie de “Imposto de Renda”(principalmente no período
pós-exílico) para a manutenção do Templo, dos Levitas (tribo sacerdotal que era
mantida pelas doações das outras tribos), dos órfãos e das viúvas. Foi
instituído por Deus com finalidades específicas, em um tempo em que a religião
e o Estado estavam intimamente ligados. O ensino bíblico no Novo Testamento
tira a questão da contribuição do campo da obrigatoriedade e chama para o
coração, para a espontaneidade, tira do ritual e chama para as intenções,
exterioriza o que está nas entranhas, e atribui valor ao propósito do ofertante
e não a porcentagem da oferta. A síntese do pensamento neotestamentário
encontra-se nos capítulos 8 e 9 de II Coríntios. Todos os demais textos em que
o dízimo é citado no Novo Testamento necessitam de uma hermenêutica forçosa,
onde Igreja vira Templo, cristão vira israelita, pastor vira sacerdote, e
sacrifícios, prosperidades, pragas, maldições, altares, voltam a cena, tudo com
a finalidade de legitimar esta prática. E é exatamente neste contexto, que
surge o tal Devorador, isso mesmo, o demônio que se alimenta da já combalida
conta-corrente daqueles que não entregaram seu dízimo ao sacerdote no altar do
templo. E cuidado, pois ele não vem só, tem seus primos, o Cortador, o
Migrador, e o Ceifador, todos imunes até mesmo ao outrora poderoso Nome de
Jesus, pois o único antídoto para esse “quarteto fantástico” do inferno, são
seus 10% mensais. Você já se questionou porque os textos prediletos de tais
defensores dos dízimos estão sempre no Antigo Testamento?
Dadas
as gigantescas diferenças entre a ideologia cristã e a israelita, quero deixar
claro que nos dias da igreja nascente, não se falava em 10%, mas em tanto
quanto fosse necessário para suprir as necessidades dos irmãos, o que
significava muitas vezes vender tudo e colocar o dinheiro sob a administração
dos apóstolos. E sendo Paulo, o apóstolo dos gentios (ou seja, todo não-judeu),
que não conheciam o Antigo Testamento e nem as práticas judaicas, não seria
razoável que ele doutrinasse a igreja sobre esse assunto? A despeito disto ele
não escreve uma linha sequer sobre o tema para os cristãos, tratando única e
exclusivamente de ofertas alçadas e voluntárias. Mas as estruturas que mantemos
hoje são caras demais, não se sustentariam com ofertas voluntárias apenas (o
que é uma verdade), por isso não sou contra quem utiliza o método do dízimo
para ofertar e ajudar a manter a estrutura eclesiástica da qual faz parte, mas
nem por isso, preciso de um “pacman financeiro” no meu calcanhar, daqueles do
tipo “se correr o bicho pega, e se não der o bicho come”.
Resolvi
escrever este texto não para falar contra o dízimo, e sobre as coisas que não
creio. Quero falar sobre o que eu acredito, e sim, eu creio no devorador!
Até
o início deste ano eu fazia parte de uma grande igreja pentecostal na Baixada
Fluminense aqui no Rio de Janeiro, onde por alguns anos liderei todo o departamento de ensino. Tudo
corria bem, até o dia em que me perguntaram sobre o famigerado “devorador”
descrito em Malaquias 3.11 (junto com o verso 10 é o “texto áureo“ do dízimo).
Bem, eu precisei tomar uma decisão rápida, visto que estava em uma aula diante
de uma classe de 30 pessoas aproximadamente, então optei por falar a verdade,
segundo a minha consciência cristã. Respondi que, o texto se referia a uma
praga, e que o tal devorador, era um tipo de gafanhoto, e que por Israel neste
período tratar-se de uma nação predominantemente agrícola, representava uma
enorme ameaça, e o texto chamava a Nação a um compromisso com Deus, e o
propósito por Ele estabelecido na reconstrução da cidade e restauração do
culto. E que para contribuir não precisamos de ameaças espirituais, mas sim
gratidão a Deus pela sua bondade e amor. Foi então que conheci o verdadeiro
devorador, não o do misticismo cristão-pentecostal, mas um pior, capaz de
saquear coisas realmente valiosas.
Perdi
o convívio com pessoas a quem eu aprendi a amar. Gente que chorou comigo, gente
com que eu chorei, me alegrei, que fizeram parte da história da minha vida, mas
que se viram obrigadas a decidir, pois se as coisas que eu estava ensinando
eram verdadeiras, então o local que, junto com seus familiares e amigos, eles
abraçaram como igreja, estava errado. Fiquei só. Isso sim doeu, mas eu também
tive que fazer escolhas, e escolhi ser fiel ao que minha consciência discerniu
como sendo o verdadeiro Evangelho. Por isso não os culpo, nem os julgo, apenas
lamento profundamente.
Não
tenho a menor pretensão de ser o dono da verdade, até porque, as verdades que
considero absolutas são invisíveis aos olhos, são discernidas pela fé, e fé é
certeza que se guarda no coração, que serve de âncora para a alma quando todas
as certezas ao nosso redor parecem ter submergido. Apesar desta subjetividade
quanto a verdade, falo com muita objetividade contra a mentira dita em nome de
Deus. Não fui chamado para ganhar dinheiro com o Evangelho de Cristo, não faço
parte de “esquemas” para obter casa própria, carro do ano, e salários de R$
10.000,00, financiados pela fé das pessoas que são manipuladas em nome de um
pseudo-evangelho, não fui chamado para me “alimentar da carne das ovelhas”.
Em
nome deste deus das riquezas, ao qual a Bíblia chama de Mamom (Mt 6.24), o
Devorador se alimenta do medo de tocar no “ungido do SENHOR”, o Devorador se
alimenta dos relacionamentos superficiais e interesseiros, se alimenta da falta de caráter
maquiavélica de alguns líderes, onde os fins justificam os meios, o Devorador se alimenta da
falta de conhecimento de Deus (Os 4.6). O Devorador se fortalece todas as vezes
que nos esquecemos que o véu do templo foi rasgado e que todos temos acesso a
Deus, e ao invés disto criamos intermediários entre Deus e homens, criamos
nossos próprios ídolos.
Sim, eu creio no Devorador!
“Porque nada trouxemos para este
mundo, e manifesto é que nada podemos levar dele.
Tendo, porém, sustento, e com que nos
cobrirmos, estejamos com isso contentes.
Mas os que querem ser ricos caem em
tentação, e em laço, e em muitas concupiscências loucas e nocivas, que
submergem os homens na perdição e ruína.
Porque o amor ao dinheiro é a raiz de
toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se
traspassaram a si mesmos com muitas dores.”
(I Tm 6.7-10)
Sou
um sonhador? Sim, e daqueles que não tem cura. Sonho com um Evangelho puro e
simples, que dê glórias só a Deus, que leve os pecadores ao arrependimento, que
nos leve de volta ao Pai. Sonho com estruturas que sejam um meio e não um fim
em si mesmas. Sonho, mas sei que não estou sozinho, muitos tem ouvido o chamado
do Pai para despertarmos e o seguirmos na construção do Seu Reino.
Para meus amados(as) aluno(as):
“Sonho com o dia em que os sapos
voltarão para as lagoas, e nos seus lugares, os verdadeiros filhos de Deus se assentarão, para a glória do nome de Jesus.”
15 comentários:
Coincidência? acho que aconteceu algo parecido comigo.Tinha até um devorador no meio da história. Um bem grande..com dentes bem afiados. Ele estava lá mesmo, todos os dias mas, ninguém o via. Só eu.
Deus te abençoe Alex e que a cada dia possamos vivenciar este evangelho puro e simples.
Pedrof
Sem palavras......grande texto.
Penso da mesma forma...........
Palavras que tenho certeza que veem do fundo do seu coração, meu irmão continue assim tentando mostrar pra nós todos um cristianismo puro e simples.
Que Deus o abençoe sempre Alex.
Grande Alex ,Tambem estou sem Palavras... Peço a Deus Que continue te mostrando, ou seja abrindo cada vez a sua mente para o Verdadeiro Cristianismo Puro e Simples. E Passe para todos nós rsrsrsrs. Uma coisa é certa muitos sao chamados e pouco serão escolhidos. Certamente Voce é um HOMEM DE DEUS, no qual Deus tem te dado Esta Visão para o Cristianismo Puro e Simples. Que voce Alcançe a Todos.
Te Amo Em Cristo Jesus
Joel Delfim
olá alex, meu nome é wallace, trabalho no hosp. quinta d'or, et conheço delá. alguém me indicou seu blog pra que pudesse ler. quero em específico comentar sobre a parte do texto em que voce fala sobre a escolha em que teve que tomar, e escolhestes bem, fez a escolha certa. quero que saiba, que se antes eu te gostava, mesmo sem termos uma amizade estabelecida, ao ler este, e outros textos mais que voce escreveu, tenho por ti uma admiração imensa. eu fui alguém que também tive que fazer uma escolha, e acabei por escolher o errado, por isso tenho essa admiração por você. fizeste a escolha certa.abraços deste teu amigo, que até então talvez nem você soubesse que eu fosse...wallace mauricio.
Alex, tenho que lhe dizer que me emocionei muito com seu texto, realmente retrata o que penso e sinto e reafirma a certeza de que não estou sozinho na busca por um evangelho que preze a verdade com âncora para a fé.
Realmente, uma hora todos nós temos que fazer uma escolha: Que Deus nos conduza as escolhas mais sábias.
Se quiser conferir meu blog: http://extremosenso.blogspot.com
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Um abraço!
Alex:
Sinta sua falta como professor da EBD. Guardo com carinho e emoção, o dia em que vc me apoiou em um momeno difícil: a morte da minha vó. Vc deixou os seus afazeres de Superintendente e foi até mim... dar o seu apoio. Eu nunca vou esquecer esse gesto.
Fico triste por vc ter saído da nossa "denominação". Estava aprendendo a amar a sua família quando de repente o laço foi rompido.
Em relação ao dízimo quero deixar uma referência bílica no Novo Testamento: Mateus 23:23.
FICA NA PAZ
Cláudia minha irmã, Paz do Senhor! Que bom ler seu comentário aqui no blog, fiquei feliz mesmo. Duas considerações, a primeira é que não escrevi o texto "contra o dízimo", apenas me posicionei sobre o que creio, e creio que o Devorador verdadeiro é a atitude capitalista que invadiu as igrejas, os relacionamentos superficias e interesseiros, e a falta de compromisso com a Bíblia.
Gostei do blog; gostei mesmo!
Já estou seguindo!
Deus o abençoe!
Cláudia, em segundo lugar, gostaria de comentar o texto que você citou, Mt 23.23 "Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! pois que dizimais a hortelã, o endro e o cominho, e desprezais o mais importante da lei, o juízo, a misericórdia e a fé; deveis, porém, fazer estas coisas, e não omitir aquelas."
O texto não está tratando do assunto "dízimo" e sim da censura que Jesus fez aos fariseus, por guardarem com rigor algumas partes da Lei, e esquecerem a sua essência, que é amar a Deus e ao próximo, note que, Jesus está falando aos judeus, e como eu disse no texto, o dízimo tinha um papel fundamental para a manutenção do Templo (que foi destruído no ano 70 d.C.), e no auxílio social aos levitas, órfãos e viúvas.
O que falo é que, não há nenhuma recomendação do gênero para a Igreja, pois há uma diferença enorme entre a Igreja do Senhor e o povo de Israel.
Paz sobre o teu coração.
Jordanny, muito obrigado pelo seu carinho, gostei do seu blog também, depois lerei as postagens com mais calma e comentarei por lá também, um abração.
Brother realmente você não está sozinho, essa vontade de ouvir pregações nas igrejas sobre o verdadeiro evangélio, aquele q está escrito e não o q é culturalizado e proveniente da mente de pastores conservadores tem surgido no coração de um grupo especial de pessoas, um grupo q resolveu estudar a palavra e viu sua verdad, grupo de pessoas digo eu q ira transformar o q se entende por protestantismo, vejo nascer o movimento neoprotestante, q qr pregar a verdad de Cristo e não a vontade dos pastores já corrompidos por um exeço de organização proveniente de legalismos, obrigado por suas palavras, elas já haviam nascido em meu coração, porém vc soube sintetizar em um texto maravilhoso
meu msn é and_lipe@hotmail.com
se puder add agradeço, existem outros conceitos q gostaria de conversar com vc
Concordo com você Alex, o verdadeiro migrador esta na igreja, separando as pessoas por pensarem diferente. Sei que a igreja tem as suas despesas mensais que precisam ser honradas, mas dizimar é um gesto de total liberdade, é um ato de partilhamento do que possuímos, é um ato de amor à comunidade da qual fazemos parte, e dizemos essa é minha igreja, por isso me engajo, me envolvo, e participo, até mesmo porque a igreja não pode fazer só por si, mas pela sociedade onde esta inserida, como agente transformadora das realidades.
ME PARECE QUE O DIZIMO NAO ESTA RESTRITO AO VELHO TESTAMENTO OU AO NOVO TESTAMENTO,MAS É PELA FÉ COMO ABRAO O DIZIMOU PELA FÉ POIS O JUSTO É JUSTIFICADO PELA FÉ E TAMBEM SEGUIMOS UMA FÉ EM JESUS QUE DISCORRE DO PRINCIPIO DA FÉ ABRAAMICA,QUEM DIZIMA PELA FÉ FAZ MELHOR,DO QUE POR ORDENANÇA OU MEDO ATÉ MESMO NO MEU PARECER.
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