sábado, 1 de setembro de 2007

Quem sou eu ?


Wer Bin Ich? Quem Sou Eu?

Quem sou eu? Freqüentemente me dizem

Que saí da confinação da minha cela

De modo calmo, alegre, firme,

Como um cavalheiro da sua mansão.


Quem sou eu?

Freqüentemente me dizem

Que falava com meus guardas

De modo livre, amistoso e claro

Como se fossem meus para comandar.

Quem sou eu? Dizem-me também

Que suportei os dias de infortúnio

De modo calmo, sorridente e alegre

Como quem está acostumado a vencer.


Sou, então, realmente tudo aquilo que os outros me dizem?

Ou sou apenas aquilo que sei acerca de mim mesmo?

Inquieto e saudoso e doente, como ave na gaiola,

Lutando pelo fôlego, como se houvesse mãos apertando minha garganta,

Ansiando por cores, por flores, pelas vozes das aves,

Sedento por palavras de bondade, de boa vizinhança

Conturbado na expectativa de grandes eventos,

Tremendo, impotente, por amigos a uma distância infinita,

Cansado e vazio ao orar, ao pensar, ao agir,

Desmaiando, e pronto para dizer adeus a tudo isto?


Quem sou eu? Este, ou o outro?

Sou uma pessoa hoje, e outra amanhã?

Sou as duas ao mesmo tempo?

Um hipócrita diante dos outros,

E diante de mim, um fraco, desprezivelmente angustiado?

Ou há alguma coisa ainda em mim como exército derrotado,

Fugindo em debanda da vitória já alcançada?

Quem sou eu?


Estas minhas perguntas zombam de mim na solidão.


Seja quem for eu, Tu sabes, ó Deus, que sou Teu!


Dietrich Bonhoeffer


Dietrich Bonhoeffer foi um grande teólogo protestante alemão, considerado um dos mais relevantes do século XX. Perseguido e aprisionado pelo nazismo, foi enviado a um campo de concentração, onde foi executado, já em fins da Segunda Guerra.Para mais textos e informações sobre Bonhoeffer, visite:www.sociedadebonhoeffer.hpg.ig.com.br.

Deus, o Noivo !


"... Deus e o homem se encontram como ‘parceiros no trabalho da criação’. Não conheço nenhuma outra visão que confira ao ser humano tamanha dignidade e responsabilidade.
A Bíblia usa muitas metáforas para Deus. Ele é um mestre e nós somos seus servos. Ele é um rei e nós somos seus súditos. Ele é um pai e nós somos seus filhos. Mas, para os profetas, a maior metáfora é o casamento. Deus é o marido e o povo de Israel, sua esposa. Oséias coloca isso na famosa passagem em que os homens judeus recitam em todos os dias da semana ao colocarem seus filactérios (tefilin):
‘Eu te desposarei para sempre.
Eu te desposarei em retidão e justiça,
Em bondade e compaixão.
Eu te desposarei com fidelidade
E tu conhecerás o Eterno’. – Os. 2.21-22.
É difícil fazer justiça ao poder desta idéia. O que nos diz sobre o homem e a humanidade? Ela sugere que a maior descoberta da Bíblia hebraica não foi o monoteísmo, o conceito de um deus Único, mas sim a idéia de que Deus é pessoal, de que no núcleo da realidade há algo que responde à nossa existência.
A afirmação da fé judaica, profundamente humana em suas implicações, é que Deus é a personificação da realidade objetiva. Nós somos mais do que moléculas concatenadas, “genes egoístas”, grãos de poeira na superfície da eternidade. O universo não é cego às nossas esperanças, aos nossos sonhos ou aos nossos ideais. Há um sofrimento genuíno quando fazemos mal uns aos outros. E quando temos esperança e lutamos e tentamos construir, algo dentro e além de nós nos pega pela mão e nos dá a força para não sermos vencidos, para continuarmos a jornada apesar de tosos os reveses e passos em falso.
[...]
Mas entre Deus e o homem há um laço de amor. Ninguém fala deste laço de amor com tanta beleza quanto o profeta Oséias, num trocadilho magistral com o nome de Baal, o deus canaanita. Baal era o antigo deus da fertilidade, encontrado nas tempestades, no trovão e na chuva. Mas a palavra ‘Baal’ também significa ‘senhor’, ‘proprietário’e, por extensão, ‘marido-patrão’ num mundo onde os homens dominavam as mulheres. Oséias compara este tipo de ligação ao relacionamento entre Deus e o povo de Israel:
‘Naquele dia, declara o Eterno,
Tu me chamarás, ‘meu marido’ [ishi]
Tu não me chamarás mais ‘meu senhor’ [baali]’. Os 2.18.
Para Oséias, no centro do culto a Baal está a idéia primitiva de que Deus governa o mundo à força, como os maridos governam suas famílias em sociedades onde o poder determina a estrutura dos relacionamentos. Em contraste, o profeta elabora uma possibilidade bastante diferente, ou o relacionamento entre os parceiros num casamento, construído sobre amor e lealdade mútua. Deus não é Baal, o que governa à força, mas sim Ish, aquele que se relaciona em amor...
Deus diz a Elias que o que o torna diferente de Baal não é por Baal ser um poder e Deus, um poder maior. Definitivamente, Deus não é um poder. Ele não está no vento, no terremoto e no fogo. Ele não se revela através da força, mas sim de uma voz que fala ao homem. E não é uma voz comum – é uma voz ‘suave, baixa’. A tradução do hebraico significa, literalmente, o ‘som de um leve silêncio’, implicando que podemos ouvi-la somente se prestarmos atenção. Deus não impõe sua presença sobre a humanidade. Apenas se o procurarmos poderemos encontrá-lo procurando por nós”.


Rabino Jonathan Sacks

O martírio de Estevão, o diácono


Estevão sabia que ia morrer naquele dia.
Os algozes decidiram.
Vestira o diaconato, junto à morte.
Apenas vão ouvi-lo, suportá-lo, antes do sacrifício.
Tinha a face de um anjo e eram pétreos os rostos dos que o viam.
Seus olhos eram pedras.
Se jogavam. Ia morrer.
Sabia. Radioso, irresoluto.
Vinham as pedras.
Ia ao encontro da angular,
certeira pedra viva.
Carlos Nejar